sexta-feira, 4 de setembro de 2015

A CERTIDÃO DE NASCIMENTO DO MUNICÍPIO DE ITABAIANA (1697)

A carta do governador-geral do Brasil para o ouvidor-geral da Capitania de Sergipe d’El Rei Diogo Pacheco de Carvalho, em 20 de outubro de 1697, pode ser considerado o documento de fundação da antiga Vila de Santo Antonio e Almas de Itabaiana, que existiu de 1697 a 1888.
Esse documento se encontrava, ou ainda se encontra, no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB), na seguinte referência documental: Livros de Cartas do Governo D. João de Lencastre, de 1686-1704, folhas 196 verso. Estivemos em Salvador, em 2012, e não localizamos essa referência documental nem o referido documento original, porém,em 1891, José de Oliveira Campos e Francisco Vicente Viana publicaram a transcrição desse importante documento histórico na obra “Estudo sobre a origem histórica dos limites entre Sergipe e Bahia”, por ordem do presidente do Estado vizinho José Gonçalves da Silva, em virtude da polêmica questão de litígio de fronteiras entre os dois estados.

Transcrição em linguagem moderna do documento

Carta para o ouvidor-geral da Capitania de Sergipe d’El Rei Diogo Pacheco de Carvalho, em 20 de outubro de 1697.
“Sua Majestade, que Deus guarde, foi servido ordenar-me por carta sua que, por convir a seu real serviço, mandasse formar as vilas que me parecessem necessárias nos recôncavos e sertões desta Capitania [da Bahia], por ser informado que as pessoas que neles vivem não só faltam as obrigações de vassalos, senão também as de católicos, e que para se evitar uma e outra coisa, se fizessem povoações onde vivam com temor de Deus e da Justiça, evitando-se por este meio os inumeráveis delitos que cometem por se não castigarem, como é justo.
Tanto que Vossa Mercê receber esta vá logo ao lugar da Itabaiana e Lagarto a formar duas vilas, escolhendo para isto os sítios [lugares] mais acomodados e fazendo com que os moradores dessa capitania [de Sergipe] queiram fazer as casas da câmara e cadeia a sua custa. E por que me dizem que no Porto da Cotinguiba se pode fazer uma vila, Vossa Mercê, mandará chamar a casa da câmara dessa cidade [de São Cristóvão], os oficiais dela com as principais pessoas desse povo para que com toda ponderação vejam se o dito porto é capaz de formar-se nele a dita vila ou se há mais lugares no distrito da jurisdição dessa Capitania em que se formem outras.
E de tudo me informará Vossa Mercê com a clareza e brevidade possível e porque cada vila das que se fizerem há de ter um escrivão da câmara que sirva também de escrivão da almotaceria, um escrivão dos órfãos, um tabelião do judicial e notas, um inquiridor, distribuidor e contador, um alcaide e um escrivão da vara, Vossa Mercê me mandará um rol [relação] com os nomes das pessoas que nessa Capitania houver mais capazes e suficientes para servirem os ditos ofícios. Deus guarde a Vossa Mercê. Bahia. 20 de outubro de 1697. D. João de Lencastre, Governador-geral do Estado do Brasil.”

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Açude da Macela: contribuição à sua história

O Açude da Macela é um dos 75 povoados do município de Itabaiana. Situado na área central mais a norte. Faz fronteira com o perímetro urbano de Itabaiana, ao sul e leste; Povoados Nicó e Gravatá, a oeste; e a norte e a leste povoados Pé do Veado, Terra Vermelho e Canário.
O nome deve-se ao Riacho da Macela. Há duas versões para o topônimo. A primeira, mais plausível, é que o nome faz referência à planta macela (Achyrocline satureioides), também conhecida por macela-do-campo, macelinha, macela de travesseiro, carrapichinho-de-agulha e camomila nacional. Esse arbusto de coloração amarelada com cerca de um centímetro de diâmetro florescendo em pequenos cachos. As folhas são finas e de cor verde-claro, meio acinzentada, que se destaca do restante da vegetação do campo, havia em abundância no antigo Riacho da Macela e ainda pode ser visto nos dias atuais. Temos também informações de antigos moradores sobre a existência de uma bela jovem de nome Marcela que teria herdado de seu pai toda aquela área. Com isso, a origem do topônimo é uma incógnita. Contudo, acreditamos que Açude da Macela deve ser entendido como derivado das palavras Açude (que só surgiu em 1958) e Macela (nome primitivo do riacho onde foi edificado o açude).
Discordamos de alguns estudos que situam o início da história do povoado Macela em meados da década de 50. A história da Macela é tão antiga quanto à de Itabaiana. Na demarcação do patrimônio da Irmandade das Almas, instituição religiosa fundada em 1665, que dez anos depois adquiriu o sítio “Catinga de Aires da Rocha” ao vigário Sebastião Pedroso de Gois, temos como limite norte do dito terreno, que futuramente dará origem ao atual centro de Itabaiana, o Riacho da Macela. Sendo assim, esse local teve sempre uma função histórica de ser o ponto intermediário entre a zona urbana e rural de Itabaiana.
Há referências a existência de grande povoamento da região desde o final do século XVIII. Nessa época, a região onde atualmente se situa os povoados Pé-do-veado e Terra Vermelha, circunvizinhos ao Açude da Macela, era bastante povoada e por famílias de alto prestígio social na vila de Itabaiana, a exemplo da família Carvalho.  Contudo, não temos informações sobre proprietários de terras onde hoje se situa o riacho da Macela.
A história da Macela tomaria outro rumo na década de 50 do século passado. Assumia a Prefeitura de Itabaiana o udnista Euclides Paes Mendonça. Homem pouco instruído, porém com larga visão progressista, Euclides resolveu enfrentar o problema da seca e modernização da agricultura familiar lutando pela construção de um açude público em Itabaiana. O município tinha apenas um açude próximo ao perímetro urbano, era o Açude Velho, construído no final do século XIX. A construção do Açude surge em decorrência das secas. A escassez de água era um dos mais sérios problemas enfrentados pela população de Itabaiana. A falta de água travava o desenvolvimento econômico. A ideia foi bem recebida pelos itabaianenses, porém faltava conseguir os recursos e apoio do governo estadual e federal para concretizar a obra.
Em 1945 era criado o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), em substituição a Inspetoria Federal de Obras contra a seca (IFOCS). O DNOCS foi transformado em Autarquia Federal em 1963, através da lei 4.229 (de 01/06/1963). Foi esse órgão federal que centrou as atividades de montagem de infra-estrutura de obras públicas de combate à seca por meio da construção de açudes públicos, represas e perfuração de poços artesianos. O DNOCS foi órgão responsável pela obra. 
As primeiras atitudes em relação à obra começam no ano de 1952. Foram longos seis anos para a obra sair do papel. Merece destaque a ação do prefeito Euclides Paes Mendonça que mobilizou seus aliados para ver a obra concluída mais rapidamente. Sobre os trabalhos para a construção do açude, o escritor Renato Mazze Lucas deixou importantes descrições acerca da vida dos trabalhadores braçais no conto “Açude”. Em 1958 era finalmente inaugurado o Açude. Grande foi a procura pelas terras próximas ao Açude da Macela. A barragem do açude da Marcela apresentava um volume médio de 2.135.200 m3, abrangendo 24 km2. Possui um coroamento de 710 metros e uma largura de 4 metros, com sangradouro de 16 metros e profundidade máxima de 14 metros.
No período da Ditadura Militar, houve a tentativa de modernização da agricultura através da mudança nas relações técnicas e sociais de produção. Essas transformações foram absolvidas pelos sitiantes do açude. Além das técnicas tradicionais, tivemos ainda o uso de novos insumos, corretivos de solo, mecanização de preparo de solo, uso de defensivos agrícolas e fertilizantes. Cabe mencionar também, o apoio do governo através de linhas de crédito aos pequenos e grandes produtores, através do FUNRURAL. Com isso, a produção local cresceu consideravelmente e o Açude da Macela era o principal perímetro irrigado do agreste sergipano. Contudo, esse processo criou os germens para o enfraquecimento do solo e degradação ambiental
Cabe destacar a importância da atividade de piscicultura que fora desenvolvida nas décadas de 70 e 80 e 90 no açude da Marcela. A pesca era a segunda mais importante atividade desenvolvida naquela área. Os pescadores vinham ao Açude e vendiam o fruto do trabalho nas feiras de todo o Estado de Sergipe.  
Em 1983, devido às vigorosas secas, o açude chegou a secar. Porém, no final da década de 80 era comum as constantes cheias que deixava a comunidade açudemacelense em situação de difícil acesso e até mesmo ilhados. Nessa época, o precário sistema de esgoto da cidade de Itabaiana é canalizado para o Açude da Macela. Começava ai a história de degradação ambiental que levaria ao estado que o Açude se encontra nos dias atuais.
Na década de 90, tivemos a implantação de três cerâmicas nas margens do açude. O despejo diário de consideráveis volumes de dejetos sanitários e industriais, produzido pela cidade, e o uso indiscriminado de agrotóxicos e fertilizantes, ocasionaria em 1994 o início da perca da produtividade agrícola do Açude da Macela. O que se observou nos anos seguintes foi a geométrica poluição das águas do açude e a desestruturação da produção agrícola. O enorme êxodo rural confirma a perca de importância da outrora zona produtora de verduras e hortaliças de Itabaiana.     
No começo deste século buscou-se revitalizar o Açude da Macela. A Prefeitura de Itabaiana buscava conseguir recursos federais para despoluir o açude e assim fortalecer o perímetro irrigado da Macela. Em 2006, com a elaboração do Plano Diretor Municipal, O Açude da Macela deixa de pertencer à zona rural para ser integrado ao perímetro urbano da cidade. Com isso, é criado o Bairro Macela.
Nas vizinhanças do Açude existem ainda pequenas propriedades, habitada por modestos sitiantes que se beneficiam das suas águas para a prática da irrigação. As culturas mais importantes são as de tomates, repolho, hortaliças (alface, coentro e etc), quiabo, batata e pimentão. 
Atualmente, o Açude da Macela é um local praticamente despovoado. As atividades agrícolas estão em franca decadência, cedendo espaço para a criação de animais. Ainda há alguns moradores que desafiam as adversidades. A situação da (in) segurança e dos impactos ambientais (e sociais) são as principais causas do êxodo ocorrido nas duas últimas décadas. O Açude da Macela de hoje é um triste capítulo na história de Itabaiana; nem lembra os tempos gloriosos da segunda metade do século passado, onde ter terras na “Macela” era sinal de prestígio e orgulho.

Referências Bibliográficas

BORGES, Sérgio dos Santos. Agrotóxicos, sociedade e natureza: a problemática do perímetro irrigado da Marcela. São Cristóvão, 1995. Dissertação de Mestrado (Núcleo de Pós-graduação em Geografia. Universidade Federal de Sergipe;

GOIS, Maria Euza de Menezes. “A glória do passado e a tristeza do presente”: memórias do perímetro irrigado do Açude da Marcela em Itabaiana-SE (1958-1980). São Cristóvão, 2002. Monografia (Departamento de História). Universidade Federal de Sergipe;

JESUS, Edneusa Santos de. Relações sociedade/natureza no Açude da Macela-SE. Itabaiana, 2002. Monografia (Departamento de Geografia). Universidade Federal de Sergipe;

LUCAS, Renato Mazze. Açude. In: Anum Prêto. Rio de Janeiro: Leituras S.A, 1967. P.33-41;


MENEZES, Wanderlei. Breves notas para a História do Açude da Marcela. Itabaiana: sd, 2008. (trabalho inédito)

Considerações sobre a bandeira do município de Itabaiana/SE

Todo município deve ter sua bandeira. Ela é o símbolo que o identifica e deve, sobretudo, representar a sua história e cultura local. É a representação iconográfica de uma coletividade. Muito mais que um pedaço de tecido pintado, a bandeira é elemento cívico de relevante valor.
Durante a Ditadura Militar é instituída oficialmente a bandeira do município de Itabaiana, através da Lei Nº 490, de 10 de maio de 1977, decretado pela Câmara Municipal de Vereadores e sancionada pelo prefeito Antônio Teles de Mendonça. Essa lei é composta por quatro artigos. No primeiro fica instituída a bandeira do Município, ou seja, ela torna-se símbolo municipal oficial. Os dois parágrafos únicos dos dois capítulos seguintes estabelecem a sua descrição: “terá listas horizontais a cores azuis (sic), amarelo, verde e branco” e “O distintivo de que trata o ‘caput’ deste artigo será representado por um livro aberto, um arado e o fogo simbólico da Pátria.”
Assim, a bandeira de Itabaiana tem as mesmas cores do pavilhão nacional e estadual, representando a integração do município à ordem nacional e estadual, hierarquicamente superiores. As cores são as mesmas que a da bandeira nacional, já o formato é mais aparentado com o símbolo estadual. O grande diferencial da bandeira municipal está no distintivo, situado na parte superior do lado esquerdo, ocupando parcela das listas verde e banco. Dentro temos quatro elementos: um livro aberto, um arado e a tocha com o fogo simbólico da pátria e o nome do município.
Examinemos cada um:
1.      O livro aberto representa o saber (educação e cultura). É um elemento que associa a terra à ideia iluminista de local que se preocupa com a educação. O conhecimento é colocado como base para o desenvolvimento e civismo local. É dos quatro elementos o mais destacado. Curiosamente, nos final dos anos 70, Itabaiana despontava no campo educacional com o Colégio Estadual “Murilo Braga”, importante instituição de ensino do interior sergipano. Em 1977, a esmagadora maioria da população itabaianense era de analfabetos ou semi-analfabetos. Pode parecer um paradoxo, mas o que se representa com o livro aberto é a expressão de uma minoria escolarizada (urbana de classe média).  Esses homens e mulheres tornar-se-ão importantes personalidades da vida social e política. O livro está em branco com contornos na cor azul.
2. O arado representa o trabalho e as atividades econômicos. É o símbolo das condições materiais de existência daquela época. A base econômica local era a agricultura, porém a presença do gado é marcante na história local desde tempos idos. O instrumento agrícola rudimentar é de certa forma uma prova inequívoca do atraso tecnológico por um lado e por outro se evoca o trabalho. O arado pode também simbolizar o povo trabalhador que transforma a natureza e o saber em riquezas por meio da energia e do vigor das mãos e da força animal. O arado tem a cor vermelha com contornos na cor azul.
3. A tocha com o fogo simbólico da pátria é o símbolo que mais denota o amor ao civismo e nacionalismo por parte dos itabaianenses. O fogo, companheiro do homem desde a Pré-história, nos tempos modernos passou a ser cultuado durante as Olimpíadas. Esse elemento era tido como sagrado nas antigas culturas. Durante a Ditadura Militar (1964-1985) é aprovada a ideia de valorização do fogo como elemento simbólico. Ficou decidido que o símbolo receberia a denominação de “Fogo Simbólico da Pátria” e que deveria percorrer o território nacional, em peregrinação cívica.  Em 1972, durante as comemorações do sesquicentenário da nossa Independência, partiram quatro chamas dos quatro pontos extremos do Brasil, em rotas distintas, para se fundirem numa só chama sagrada, no dia 7 de Setembro, no Monumento do Ipiranga, em São Paulo, histórico local do famoso grito da Independência. Assim, o fogo é lembrado pelos vereadores e prefeito municipal como uma prova de subserviência à ordem vigente e aos valores cívicos da Ditadura. O fogo tem a cor vermelha com contornos na cor azul.
4. O nome “ITABAIANA-SE” é dos elementos o de mais fácil explicação: serve para designar o município. O “SE” é a sigla do Estado de Sergipe, pois há outra Itabaiana na Paraíba. O nome está abaixo do livro, do arado e da tocha com o fogo da pátria. As letras estão em maiúscula e em posição côncava em relação aos outros elementos. A cor das letras é azul.
A bandeira municipal é pouco conhecida pelos itabaianenses. Ela comumente aparece em solenidades cívicas, a exemplo de “aniversário da cidade” e “7 de setembro”, discreta entre as bandeiras estadual e nacional ou hasteada em órgãos públicos. Não são poucos os que a confunde com o escudo tricolorido da Associação Olímpica de Itabaiana (azul, vermelho e branco). Se fizermos a pergunta quais as cores da bandeira de Itabaiana, a resposta deve ser: as mesmas da bandeira nacional (verde, amarelo, azul e branco).